terça-feira, 9 de novembro de 2010

Ai, ai, que bom!

Quando li pela primeira vez Chuva de Caju de Joaquim Cardozo(1897/1978), fiquei tomada de muito prazer. Era aquilo mesmo que eu vira e sentira acontecer no nordeste brasileiro. A suavidade e a poesia telúrica estavam ali presentes nas imagens construídas por Joaquim que, apesar das dificuldades por que passam os sertanejos, ainda assim, ele trouxe-nos calores, sabores e aromas daquele chão crestado pelo sol. - Ei, dona Maria e dona Tereza, o que me trazem aí nesses cestos?
- É caju, meu fio, vai querê? Responderam ambas ao mesmo tempo.
Quem vê e vive cenas assim, jamais vai querer esquecê-las e, se possível, vai passá-las adiante.

Roçados de doces melancias, muricis com odor azedo e forte, umbus com gosto de mel e muitos cajueiros chovendo suas carnes suculentas a descer por nossas gargantas secas. Sucos e lambuzos de frutas e poesia que o Mestre pernambucano traduziu para nós. Até chinês ele lia no original, querem mais do que isso? Para mim é o suficiente se até no Português eu me engasgo.

Joaquim Cardozo não se contentou em ser Mestre na Poesia e sua estrada foi mais longa.
Ele tornou-se um dos maiores engenheiros calculistas do mundo e junto aos cérebros privilegiados de Oscar Niemeyer e Lúcio Costa saiu construindo Brasília, Pampulha e muita arquitetura boa por esse Brasil afora.
Tímido ao extremo, manteve-se afastado das badalações literárias, mas suas Obras - no papel e no cimento - ultrapassaram fronteiras e se eternizaram feito as pirâmides do Egito.

Chuva de Caju

Como te chamas, pequena chuva inconstante e breve?
Como te chamas, dize, chuva simples e leve?
Tereza, Maria?
Entre, invade a casa, molha o chão,
Molha a mesa e os livros.
Sei de onde vens, sei por onde andaste.
Vens dos subúrbios distantes, dos sítios aromáticos
Onde as mangueiras florescem, onde há cajus e mangabas,
Onde os coqueiros se aprumam nos baldes dos viveiros.
E em noites de lua cheia passam rondando os maruins:
Lama viva, espírito do ar noturno do mangue.
Invade a casa, molha o chão,
Muito me agrada a tua companhia,
Porque eu te quero muito bem, doce chuva,
Quem te chamas, Tereza ou Maria?

Musicalmente, já que trouxe aqui o filho, Gonzaguinha, solicito agora, a gentileza ao pai, Gonzagão, para que se apresente e faça Elba Ramalho, essa menina arretada, cantar com voz de pastorinha a Estrada de Canindé. Venha, Elba, cante bonito pra gente!
Ouçam bem essa preciosidade que vai continuar na próxima postagem quando, se Deus quiser, pedirei a Graciliano Ramos que fale de Vidas Secas para quem quiser ouvi-lo. Mas me digam, meus compadres, quem aí sabe que o galo campina quando canta muda de cor? E essa gente andando a pé, vai oiando coisa a grané, coisas que pra mode vê, o cristão tem que andá a pé...