segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

100, SEM CARMEN MIRANDA

1955

O céu de verão, tão azul, protegia uma criança distraída no seu mundo de fantasias, a brincar no quintal de um bairro do Rio. O mundo das formas, das pessoas adultas e das coisas estavam dela distantes.
Um som repentino corta o vácuo e as ondas de rádio lhe trazem uma voz tonitroante de um homem, seria um deus? Não, era o locutor Heron Domingues.
"- Alô, alô, Repórter Esso, alô!"
"- Urgente, queremos comunicar ao Brasil que a cantora brasileira, Carmen Miranda, acaba de falecer de um infarte fulminante em sua casa nos Estados Unidos..."
A criança se assusta, mas permanece brincando. O tempo escoa, parece lento, mas rápido passa. O quintal não mais existe e o brinquedo quebrou-se...
Carmen foi a mulher que todos supunham imortal e que não tendo suportado o peso de ser "deusa" teve seu coração estilhaçado pela dor e sucumbiu.
Os últimos momentos não foram do mito, mas de Maria do Carmo Miranda da Cunha, nascida portuguesa, mas trazida ao Brasil muito menina por sua mãe e irmã, Olinda, pobre Olinda que morreu tuberculosa. O pai, barbeiro, veio na frente e se estabelecera no Rio para garantir-lhes uma chegada mais confortável. Mas Maria do Carmo não viveria seus primeiros anos só de confortos. Trabalha em fábricas de gravatas e numa chapelaria. Por acaso, foi nesses ambientes fabris que nasceu a dedicada artesã de turbantes monumentais e indumentárias bordadas pelas próprias e pequenas mãos calejadas? Tenho quase certeza que sim.
Maria do Carmo virou Carmen por sugestão de um tio, apaixonado pela ópera Carmen de Bizet. Bem, que ela "vestiu" a baiana estimulada por Caimmy e levou seus balangandãs além das nossas fronteiras, isso não se discute. O dinheiro veio aos borbotões e o desencanto também.
Politicamente discutida até hoje como marionete da tal "política da boa vizinha" (boa para quem? Já sabemos hoje), Maria do Carmo, assim como a garotinha do quintal do bairro de subúrbio do Rio, só queriam brincar, uma para si mesma, a outra para os outros. A primeira viveu para contar um pouco da segunda que virou mito e, mesmo assim, se desencantou com o complicado mundo da fama. Ela penou duplamente: com a "culpa do sucesso internacional" e com a frieza dos ricos que frequentavam o Cassino da Urca. O samba "Disseram que Voltei Americanizada" assim nos demonstra, embora o temperasse com muito humor e picardia. Já estava ferida de morte!
Em 1972, a Serrinha, favela simpática de Madureira, explodiu na avenida com "Alô, Alô! Taí Carmen Miranda". O IMPÉRIO SERRANO desfilava mostrando ao Brasil sua Pequena Notável:
"Uma Pequena Notável / Cantou muito samba / É motivo de carnaval / Pandeiro / Camisa listrada / Tornou a baiana internacional / Seu nome corria chão / Na boca de toda gente / Que grilo é esse / Vou embarcar nessa onda / É o Império Serrano que canta / Dando uma de CARMEN MIRANDA / Cai, cai, cai / Quem mandou escorregar / Cai, cai, cai / Eu não vou te levantar..."
A gaúcha e brasileiríssima, Elis Regina, imortalizou esse samba-enredo na sua voz inigualável.
Enganam-se aqueles que pensam que essa é uma história de carnaval, essa é a minha história que o destino cruzou com a de Maria do Carmo...

100 ANOS DE NASCIMENTO DE CARMEN MIRANDA:
"Taí, eu fiz tudo pra você gostar de mim / Ai, meu bem / Não faça assim comigo, não / Você tem / Você tem / Que me dar / Seu coração..."
SEU CORAÇÃO É NOSSO, CARMEN!

Carmen, no apogeu da sua carreira

Homenagem, politicamente discutível, à "República das Bananas"

O casamento com o americano David Sebastian

A artesã humilde que consegue subir com os seus próprios dotes artísticos

A casa onde nasceu em Marco de Canaveses, Distrito do Porto, Portugal

Carro alegórico do desfile apoteótico do Império Serrano em 1972

Museu Carmen Miranda no Aterro do Flamengo, Cidade do Rio de Janeiro

Mausoleu onde foi sepultada no Cemitério São João Batista, Rio de Janeiro

Chora Pierrô

Chora

Eu sei que a

Tua Colombina já

Foi embora...